A corrida pela transição energética pode ter um efeito inflacionário no curto prazo devido a uma maior demanda pelos insumos e serviços necessários para que a oferta de energias renováveis atinja o patamar ideal. Apesar dessa pressão temporária, que pode e deve ser mitigada por políticas públicas, esse caminho é necessário para evitar prejuízos maiores no futuro.
De maneira geral, migração dos combustíveis fósseis para as fontes renováveis vai demandar investimentos elevados. Há uma demanda global maior por minério de ferro, necessário para a construção de parques eólicos, e por lítio, essencial na fabricação das baterias para os carros elétricos. Essa procura acaba levando a um aumento dos preços.
A transição pode ainda causar um aumento da desigualdade, em que pessoas e países com mais recursos acessarão primeiro as fontes renováveis.
Esses dois fatores fazem com que os governos tenham em mãos ferramentas para mitigar as pressões no curto prazo.
Nas contas da resseguradora Swiss Re, a transição energética poderá elevar o índice de preços ao consumidor global em um ponto percentual em um período de dez anos (2022 a 2031) na comparação com o período anterior. No entanto, a expectativa é que esse efeito seja passageiro, se a migração para as fontes renováveis for de fato feita.
“Quanto mais rápida for a transição, mais esperamos que a inflação aumente, mas também mais cedo esperamos um ponto de virada, após o qual o impacto deve se tornar desinflacionário. Quanto mais cedo começarmos a mitigar as alterações climáticas, menos ‘inflação climática’ poderemos esperar nas próximas décadas”, de acordo Diana van der Watt, economista do Swiss Re Institute.
Ação dos bancos centrais
Os efeitos inflacionários desse processo também já estão no radar dos bancos centrais. Na Europa, por exemplo, uma das iniciativas é a compra de títulos corporativos de empresas com melhor desempenho climático. A ideia é garantir melhores condições de competitividade para as empresas que estejam comprometidas com a transição.
“A transição verde representa um desafio político excepcionalmente difícil porque os riscos de fracasso são muito elevados e, no entanto, o caminho para o sucesso é muito complexo”, afirmou Christine Lagarde, presidente do ECB (sigla em inglês para Banco Central Europeu) em conferência realizada no último mês.
Para evitar esse efeito inflacionário, uma das saídas é trabalhar para reduzir esses custos de produção da energia verde. O primeiro grande passo foi dado pelos Estados Unidos, com a aprovação da IRA (Inflation Reduction Act), em que estão previstos US$ 394 bilhões em incentivos fiscais e empréstimos para garantir uma economia mais verde a um custo competitivo.
A resposta foi global. O Japão aprovou uma lei para a “transformação verde” no início de 2023. Canadá, França e Austrália fizeram o mesmo, tendo como foco a busca de uma maior oferta de energia renovável, mitigando o custo de instalação dessas estruturas.
O Brasil tem o benefício de já ter uma matriz energética mais limpa que a média global. No Brasil, mais de 80% da geração de energia é de fontes renováveis, ante cerca de 30% da média global. Isso, no entanto, não nos deixa fora dos efeitos inflacionários de curto prazo da transição energética global. O aumento do preço dos insumos ocorre em nível global, o que pode encarecer a instalação de novos projetos no Brasil. Também é preciso pensar em como viabilizar que a maior parte da população tenha acesso a uma energia mais limpa.
Mas, diferente de outras economias, ainda falta por parte do governo brasileiro um direcionamento claro sobre o que será feito para contornar a pressão inflacionária global e efetivar a transição verde. No discurso, há a intenção de incentivos e recursos financeiros para garantir os investimentos necessários, no entanto, não há nada de concreto anunciado, o que pode deixar o Brasil para trás nessa corrida.