Transição energética depende de cooperação de países ricos com nações em desenvolvimento

“Haverá conflitos políticos pelo controle da água” e “mudanças climáticas estão fora de controle” são alertas recentes feitos respectivamente por Papa Francisco e Carol Chouchani, líder do departamento de Mudança Climática e Sustentabilidade dos Recursos Naturais da ONU na região árabe.

O Brasil tem responsabilidade essencial na missão global de combate ao avanço da temperatura do planeta. O principal caminho está no investimento para a realização sustentável da transição energética, com a participação ativa da sociedade, de empresas de todos os setores da indústria, e do poder público.

O governo federal anunciou recentemente que irá disponibilizar o valor de R$75,7 bilhões em recursos ao longo de quatro anos para o setor de Energia. De acordo com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), serão 343 novos projetos, com um total de 18.474 megawatts (MW).

O Instituto de Pós-Graduação de Genebra e o programa da ONU para o Meio Ambiente criaram um relatório que apresenta alternativas para auxiliar a sustentabilidade ambiental e econômica do comércio internacional.

O documento foi apresentado no Fórum sobre Comércio, Meio Ambiente e Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização Mundial do Comércio (OMC) e deve ser discutido em eventos globais nos próximos meses.

Princípios abordados no relatório do grupo de especialistas internacionais

Transição energética

Fonte: TESS

Para o professor Umberto Celli Junior, professor de Direito Internacional da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP, que participou da criação do documento, os princípios apresentados no relatório devem ajudar e levar os países a diálogos de um assunto que considera sensível.

“Destaco dois pontos: soberania e responsabilidade comum e diferenciada. Ao adotar medidas pensando na transição energética, um país não pode impor as mesmas decisões a outra nação”, alerta Umberto Celli.”

Durante o evento na ONU no mês de setembro, o ministro de Minas e Energia do Brasil, Alexandre Silveira, declarou que o Brasil considera fundamental discutir em conjunto a transição energética de modo global.

“Os países do Sul Global, da América do Sul e do sul da Europa representam muito na descarbonização e na salvaguarda do planeta. O Brasil quer, junto e de mãos dadas com esses países, poder fazer a transição e negociar com os mais industrializados a transição energética tão fundamental para a salvaguarda, mais uma vez, ambiental do nosso planeta e do nosso clima. Mas de forma justa e inclusiva para que ela possa ser uma grande oportunidade de combater a desigualdade e fazer a transição social.”

A preocupação com os desequilíbrios econômico e sustentável é outro fator presente no relatório apresentado na OMC. O professor Umberto Celli Junior ressalta que o processo de transição energética depende prioritariamente da saúde financeira de cada Estado.

“Os países em desenvolvimento possuem menos recursos. Então, eles fazem a transição energética em uma velocidade diferente. Quando nações desenvolvidas impõem os seus padrões aos outros, piora o princípio da responsabilidade comum e diferenciada.”, explica o professor.

Promessa estacionada

A Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2009, COP15, gerou expectativa mundial. Na ocasião, em Copenhague, os países ricos prometeram disponibilizar US$ 100 bilhões a países do hemisfério Sul para a transição energética com foco na redução de emissão de gases poluentes – o que não ocorreu.

“Até agora, não vimos estes recursos. Não adianta você fazer a transição energética em parte do mundo. Você não resolve o problema do clima. Você mascara”, diz o professor Umberto Celli Junior.

“Para fazer a transição energética, isso tem um custo, é caro. As empresas e as indústrias de cada país têm que passar por um processo de adaptação para mudar da economia de alto carbono para a de baixo carbono. Então, vejo que é preciso que haja recursos”, conclui.

 Impacto da guerra na transição energética

A guerra entre Rússia e Ucrânia, que começou em fevereiro de 2023, acentuou a dependência de países europeus por combustíveis fósseis.

“O efeito da guerra é global. Tem impacto imediato. Alguns países que estão em fases avançadas de transição energética tiveram que desacelerar este processo, por exemplo, importando mais gás do que o planejado. Isso pode prejudicar, causar um atraso no cumprimento de metas”, aponta Umberto Celli Junior.

 Relatório TESS e Acordo de Paris

O principal acordo mundial para reduzir emissões de gases de efeito estufa foi assinado em 2015 pelos 195 países que fazem parte das Nações Unidas. O objetivo central é de impedir avanço das mudanças climáticas, como o aumento da temperatura global acima dos 2ºC.

“Para cumprir as metas do Acordo de Paris, os países têm que fazer esforços de adaptação e mitigação.”

Esta é a avaliação de Umberto Celli Junior. O responsável por contribuir com o relatório de princípios do direito internacional para conciliar comércio e políticas climáticas apresentado neste semestre de 2023 à OMC acredita que a cooperação entre as nações também é essencial para o equilíbrio na luta em defesa do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável.

“Se você adota medidas unilaterais sem negociação, sem cooperação, você acaba prejudicando o desenvolvimento de outros países. Muitos países em desenvolvimento vão estar impedidos de importar mercadorias para estes países (ricos) que adotam medidas mais rigorosas”, alerta o especialista em direito internacional.

A discussão destes pontos entre os países é o objetivo central do relatório Instituto de Pós-Graduação de Genebra e o programa da ONU para o Meio Ambiente que está na mesa da Organização Mundial do Comércio.

O papel da OMC é tão importante quanto os recursos e ações para o processo de descarbonização mundial por meio da economia, tendo em vista a missão de evitar que países se apropriem do combate à mudança climática para criar políticas comerciais protecionistas que prejudiquem principalmente a exportação de países em desenvolvimento.

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