Oportunidades serão acompanhadas de desafios após regulamentação do mercado de carbono

Uma mistura de desafios financeiros e oportunidades de inovação para empresas após a regulamentação do mercado de carbono: esse é o cenário visto a curto prazo por Carlos Alberto Tavares Ferreira, CEO da Carbon Zero. “Espera-se uma maior conscientização sobre as emissões de carbono”, diz o executivo que avaliou ainda os impactos no mercado de trabalho do setor de combustíveis fósseis e o avanço da reindustrialização até a COP 30 no Brasil, entre outros temas.

Veja a entrevista completa:

Qual a sua expectativa em relação ao avanço da regulamentação do mercado de carbono? Na sua avaliação, o PL 2.148/2015 deve ser aprovado no primeiro semestre deste ano?

Minha expectativa em relação ao avanço da regulamentação do mercado de carbono é positiva, considerando a crescente conscientização sobre as mudanças climáticas e a necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Quanto ao PL 2.148/2015, que trata desse assunto, sua aprovação no primeiro semestre desse ano, ao meu ver, é incerta, pois depende de diversos fatores políticos e técnicos. No entanto, acredito que há reconhecimento crescente da importância desse tipo de legislação, o que pode impulsionar sua aprovação.

Com a regulamentação do mercado de carbono, quais impactos devem ocorrer a curto prazo?

Entendo que a regulamentação do mercado de carbono tende a ter vários impactos a curto prazo. Primeiramente, pode-se esperar uma maior conscientização das empresas sobre suas emissões de carbono, levando a esforços para reduzi-las. Isso pode resultar em investimentos em tecnologias mais limpas e em práticas de negócios mais sustentáveis. Além disso, a criação de um mercado de carbono pode estimular a inovação em energia limpa e soluções de baixo carbono. Por outro lado, algumas indústrias podem enfrentar desafios financeiros iniciais enquanto se adaptam às novas regulamentações. Vejo a curto prazo que podemos esperar uma mistura de desafios e oportunidades à medida em que as empresas se ajustam às novas regras e buscam maneiras de mitigar suas emissões de carbono.

Além da regulamentação, quais os entraves para o avanço do mercado de carbono no Brasil?

Identifico alguns entraves adicionais para o avanço do mercado de carbono no Brasil, que vão além da regulamentação. Primeiramente, a falta de transparência e confiabilidade nos dados de emissões de carbono pode dificultar a precificação adequada das emissões e a participação efetiva no mercado. Pontuo também a falta de propostas que sustentem os projetos por 30 anos (prazo para implantar o estudo e o projeto de precificação dos créditos e colheita anual), atendendo sua finalidade socioambiental. A falta ou incapacidade técnica e presencial de fiscalização pelos órgãos que emitem as certificações e validações. Outro ponto é a ausência de incentivos econômicos suficientes para reduzir as emissões, o que pode desestimular empresas e setores a investirem em práticas mais sustentáveis. A infraestrutura adequada também preocupa, como sistemas de monitoramento de emissões. Além disso, a incerteza política e regulatória pode desencorajar investimentos de longo prazo no mercado de carbono. Superar esses desafios exigirá cooperação entre governos, empresas e sociedade civil, bem como políticas públicas claras e consistentes que incentivem a redução das emissões de carbono.

Em qual patamar o mercado de carbono estará até a realização da COP 30 no Brasil?

Acho difícil prever com precisão o patamar exato em que o mercado de carbono estará até a realização da COP30 no Brasil. No entanto, esperamos que até lá haja avanços significativos na implementação de políticas e regulamentações relacionadas ao mercado de carbono, impulsionadas pela urgência de lidar com as mudanças climáticas. Idealmente, esperamos ver um aumento na participação de países e empresas no mercado de carbono, com sistemas mais robustos de precificação de carbono e metas ambiciosas de redução de emissões. Isso dependerá de uma série de fatores, incluindo o progresso na mitigação das mudanças climáticas, o desenvolvimento tecnológico e a vontade política global. O importante é continuar trabalhando arduamente para impulsionar o mercado de carbono e alcançar resultados significativos na luta contra as mudanças climáticas até a realização da COP30.

Quais as fragilidades do mercado de carbono?

Uma delas é a falta de harmonização e coordenação entre os diferentes sistemas de precificação de carbono em todo o mundo, o que pode levar a distorções de preços e falta de eficácia na redução das emissões globais. Além disso, a volatilidade dos preços do carbono pode dificultar o planejamento de longo prazo para investimentos em projetos de baixo carbono. Outra fragilidade é a vulnerabilidade à fraude e manipulação devido à complexidade dos sistemas de negociação de carbono. Alguns críticos apontam que os mercados podem permitir que empresas poluidoras simplesmente comprem créditos de carbono em vez de reduzir suas próprias emissões, o que pode não ser eficaz para combater as mudanças climáticas. Superar essas fragilidades exigirá abordagem cuidadosa e colaborativa entre governos, empresas e especialistas para desenvolver sistemas de precificação de carbono mais robustos e eficazes.

Qual o papel dos combustíveis fósseis no processo de transição energética?

Os combustíveis fósseis desempenham um papel significativo no processo de transição energética atual. Embora seja imperativo reduzir gradualmente o uso de combustíveis fósseis para combater as mudanças climáticas, é importante reconhecer que esses recursos ainda são fonte importante de energia em muitas partes do mundo. Durante a transição, os combustíveis fósseis podem servir como uma ponte para fontes de energia mais limpas, como a solar, eólica e hidrelétrica, fornecendo energia confiável enquanto as tecnologias de energia renovável são desenvolvidas e implementadas em larga escala. É crucial implementar políticas e investimentos que incentivem a redução gradual da dependência dos combustíveis fósseis, promovendo uma transição justa e sustentável para um sistema energético mais limpo e resiliente. Isso envolve medidas como a implementação de precificação de carbono, investimentos em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias limpas e a promoção de políticas de eficiência energética.

Como a transição energética impacta no mercado de trabalho?

À medida em que as sociedades mudam para fontes de energia mais limpas e renováveis, como solar, eólica e hidrelétrica, novas oportunidades de emprego surgem em setores como instalação, manutenção e operação dessas tecnologias. Mas também é importante reconhecer que essa transição pode levar à descontinuação de empregos em setores dependentes de combustíveis fósseis, como mineração e extração de petróleo e gás. Entendo que é essencial implementar políticas de transição justa que ajudem os trabalhadores afetados pela mudança a adquirir novas habilidades e encontrar empregos em setores emergentes. Isso pode incluir programas de treinamento profissional, apoio à reconversão da indústria e medidas de proteção social para garantir que ninguém seja deixado para trás durante essa transformação. A transição energética oferece oportunidades para criar empregos sustentáveis e de qualidade, mas também requer um enfoque cuidadoso na gestão das mudanças no mercado de trabalho.

Como alinhar a redução da emissão de gás carbônico no Brasil com a sustentabilidade econômica?

Alinhar a redução das emissões de gases de efeito estufa no Brasil com a sustentabilidade econômica requer uma abordagem equilibrada e integrada. Isso envolve a implementação de políticas que promovam a eficiência energética, o uso de energias renováveis e práticas agrícolas sustentáveis, ao mesmo tempo em que impulsionam o crescimento econômico e a criação de empregos. Uma maneira de alcançar esse alinhamento é investir em setores-chave que possam impulsionar a economia de baixo carbono, como a indústria de energias renováveis, o transporte público sustentável e a agricultura de baixa emissão de carbono. Ao mesmo tempo, é importante garantir que essas políticas considerem os impactos sociais e econômicos, protegendo os trabalhadores e comunidades afetadas pela transição. Além disso, acho imprescindível estabelecer incentivos econômicos, como precificação de carbono e políticas de subsídios, que favoreçam atividades de baixa emissão de carbono e desincentivem práticas poluentes. Ao fazer isso, podemos promover uma economia mais sustentável e resiliente, ao mesmo tempo em que contribuímos para a redução das emissões de gases de efeito estufa e mitigação das mudanças climáticas.

Em meio à reindustrialização global, qual a importância da agricultura regenerativa?

A agricultura regenerativa é uma abordagem que visa não apenas produzir alimentos de forma sustentável, mas também restaurar ecossistemas e promover a saúde do solo, da biodiversidade e do ciclo da água. Em um contexto de reindustrialização global, onde há uma crescente demanda por recursos naturais e uma pressão sobre os sistemas agrícolas tradicionais, a agricultura regenerativa desempenha um papel importantíssimo. Ela oferece uma alternativa viável e sustentável, permitindo que os agricultores produzam alimentos de forma eficiente, ao mesmo tempo em que reduzem a dependência de insumos externos, como fertilizantes sintéticos e pesticidas. Além disso, a agricultura regenerativa pode ajudar a mitigar as mudanças climáticas, capturando carbono atmosférico e armazenando-o no solo. Isso não apenas contribui para a redução das emissões de gases de efeito estufa, mas também aumenta a resiliência dos sistemas agrícolas diante de eventos climáticos extremos. Em meio à reindustrialização global, a agricultura regenerativa emerge como estratégia essencial para promover a segurança alimentar, proteger o meio ambiente e contribuir para um desenvolvimento sustentável e resiliente a longo prazo.

O senhor gostaria de tratar sobre algum outro ponto relacionado à transição energética?

Vejo a necessidade de promover a democratização do acesso à energia limpa e sustentável. Isso envolve garantir que todas as comunidades, independentemente de sua localização ou condição socioeconômica, tenham acesso equitativo a fontes de energia renovável e tecnologias limpas. Ao promover a democratização da energia, não apenas ajudamos a reduzir a pobreza energética e a melhorar a qualidade de vida das pessoas, mas também fortalecemos a resiliência das comunidades diante das mudanças climáticas. Com a energia limpa, as comunidades podem se tornar mais auto suficientes e menos dependentes de fontes de energia fósseis, reduzindo assim sua vulnerabilidade a choques externos nos preços dos combustíveis e interrupções no fornecimento de energia. Além disso, a democratização da energia cria oportunidades econômicas e de emprego em nível local, estimulando o desenvolvimento sustentável e inclusivo. Ao envolver as comunidades no processo de transição energética, podemos garantir que os benefícios sejam compartilhados de forma justa e que ninguém seja deixado para trás. Para uma transição energética bem-sucedida, é essencial não apenas priorizar fontes de energia limpa, mas também garantir que essas tecnologias estejam acessíveis a todos, contribuindo assim para um futuro mais justo, sustentável e resiliente para todos os habitantes do planeta.

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