A onda de calor extremo que atingiu diversas regiões do país fez com que houvesse uma alta no consumo de energia. Na última semana de setembro, o Dessem determinou o uso de termelétricas para atender esta demanda.
A decisão de acionar usinas termelétricas elevou o preço do piso. O valor de R$ 69/MWh saltou para R$620,95/MWh, às 18h desta quinta-feira (28), uma alta de 900%.
Ritchie Guder, diretor na Enercore Trading, estima que o impacto para o consumidor final seria de R$ 20 milhões ao dia. “Se esse comportamento perdurar, estaríamos falando de um custo adicional de R$ 600 milhões por mês nos reajustes tarifários”, ressalta o executivo.
A Agência Nacional de Energia Elétrica trabalha atualmente com a bandeira verde para todos os consumidores do Sistema Interligado Nacional (SIN), algo corre o risco de ser alterado diante do aumento do valor-base de Megawatt-hora causado pelo Dessem.
“O sinal de preço dado agora pelo modelo tende a se repetir com maior frequência. E isso tudo considerando que estamos numa situação extremante confortável quanto ao nível dos reservatórios. Se tivermos um período chuvoso ruim no próximo Verão, o sinal de preço do modelo ficará ainda mais volátil”, alerta Ritchie Guder.
“Essa alta volatilidade dos preços horários de energia pode inviabilizar novos investimentos em usinas solares, e afetar seriamente a rentabilidade das usinas em operação.”
Questionamos o ONS e a ANEEL, responsável pelo Dessem, sobre a alta de custo para empresas, e também possivelmente a consumidores. Até o momento da publicação desta reportagem, as instituições não responderam às perguntas.
Empresas do setor de Energia sentiram o efeito imediato no orçamento. “Os geradores solares que venderam energia de forma “flat” passam a ter uma conta a pagar no final do mês, em função da enorme diferença do PLD horário versus a curva de geração solar”, explica o diretor da Enercore Trading.
Com o impacto referente ao dia 28 de setembro na casa dos R$ 125/MWh para este tipo de geração, o que representa um aumento de 81% em relação ao PLD mínimo, numa usina solar com geração média de 100MW, o impacto seria de R$ 300 mil ao dia. Prolongando ao longo de um mês, esse valor chegaria a R$ 9 milhões.
A decisão oposta do ONS à indicação feita pelo Dessem faz o mercado questionar as métricas utilizadas e gera dúvidas sobre a confiabilidade do mecanismo da ANEEL.
Causa estranheza que até poucos dias vivenciávamos a impressão de um quadro de excesso de capacidade de geração, reservatórios cheios, e preços baixos de energia que poderiam perdurar por alguns anos. O susto dessa semana demonstra que a realidade não é bem assim.
Se considerarmos a questão do aquecimento global, potencializada pelo fenômeno El Niño, provavelmente enfrentaremos temperaturas elevadas (ou até extremas) durante o verão, e isso demandara muita energia. Neste cenário, o sinal de preço dado agora pelo modelo tende a se repetir com intensidade muito maior.
A nossa matriz energética, até então tida como das mais limpas do mundo, ficará mais suja, e possivelmente perderemos algumas posições no ranking global. Sem mencionar a maior dificuldade em cumprir das metas de emissão de CO2 assumidas pelo país.
A médio-prazo, essa nova realidade de preço de energia pode colocar em xeque a competitividade do Brasil nos movimentos de powershoring e da neo-industrialização, o que seria desastroso dentro da estratégia de crescimento econômico traçado pelo governo.
O que é o Dessem?
O Dessem é o modelo de otimização criado para estabelecer a melhor distribuição de geração de usinas para atender a demanda do sistema elétrico brasileiro, além de calcular o Custo Marginal de Operação (CMO) a cada meia hora.