Itaipu gasta com ciclovia, mas quem paga a conta é o consumidor. Até quando?

Construção de estradas, melhora de acesso ao aeroporto, novas pontes, criação de praças, instalação de ciclovias e suporte a hospitais e programas sociais. Tudo isso cabe bem em um orçamento de uma prefeitura, mas quem arcou com os custos foi a hidrelétrica de Itaipu. As empresas podem contribuir para o desenvolvimento das áreas em que atuam, o problema é que a conta das benesses da estatal federal acabam por cair na conta dos consumidores de energia de todo o país.

Nos anos anteriores (2019 a 2022), Itaipu desembolsou R$ 1,6 bilhão para obras sociais e estruturantes em regiões próximas à usina, localizada em Foz do Iguaçu (PR). Esse montante tende a subir. Só para este ano está previsto mais R$ 1 bilhão e a área de abrangência para as obras socioambientais e estruturantes subiu de 55 para 434 municípios.

Diferente dos desembolsos de outras usinas, esses gastos acabam impactando as tarifas da maior parte dos consumidores de energia de todos o país.

“Todos os custos relacionados à Itaipu são reconhecidos nas tarifas pagas por todos os brasileiros das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, que são cotistas de Itaipu”, explica Helder Souza, diretor de regulação da consultoria TR soluções.

Quem é cotista de Itaipu, na verdade, são as distribuidoras dessas regiões. Essa tarifa foi fixada, para o ano de 2023, em US$16,19 KW/mês. Esse valor inclui os custos de operação da hidrelétrica, a energia negociada com o Paraguai e também os  gastos socioambientais e estruturantes.

Ritchie Guder, diretor na Enercore Trading, lembra que esses gastos estruturantes começaram a crescer compensando, de certa forma, a falta de capacidade de investimento dos governos.

“Isso tudo vai somar-se ao restante dos custos. Esse total é divido pelo volume esperado de energia de Itaipu e aí vira tarifa. Então quem está pagando essas obras são os consumidores de energia. E essa é uma tarifa que as distribuidoras pagam de forma compulsória “, explica.

Compra compulsória

Essa compulsoriedade na compra de energia de Itaipu foi estabelecida, no passado, para que a conta da construção da usina fosse paga. A dívida, no entanto, foi liquidada no início de 2023. Portanto, a tarifa deveria cair. A ampliação da atuação da hidrelétrica para outras funções além da geração de energia dificulta a materialização dessa queda.

As obras assumidas por Itaipu não são a única fonte de questionamento em relação à usina. Para estabelecer o preço do PLD mínimo (Preços de Liquidação das Diferenças), que serve como referência para o mercado de energia de curto prazo, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) tem tomado como referência a tarifa de Itaipu, mais alta, enquanto a lei determina que seja considerado o CMO (custo marginal de operação) das usinas do sistema.

Procurada, a Abradee (Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia Elétrica) não se manifestou sobre o tema.

Colocar na conta da tarifa gastos públicos ou tomar como referência para todo o sistema a tarifa mais elevada faz com que o Brasil perca competitividade. Para combater esse problema, a Frente Nacional dos Consumidores de Energia, que é formada por entidades como o Idec (Instituto de Defesa do Consumidor) e o Icen (Instituto dos Consumidores de Energia), tem se organizado para que essa tarifa seja menos custosa e mais transparente para toda a sociedade.

“O Brasil reúne todas as condições para ter uma energia barata, mas aplica aos consumidores uma das contas de luz mais caras do mundo. Esse custo compromete a renda e a segurança alimentar das famílias, bem como a competitividade da empresa”, defende a Frente.

O que se questiona não é a necessidade ou não dessas obras e ações sociais. Entre as despesas previstas para 2023, Itaipu deve construir 200 moradias para atender famílias que atualmente moram em palafitas. Não há dúvida de que as pessoas precisam ter melhores condições de vida, mas esse é o tipo de investimento que deveria ser feito pelo governo, nas diferentes esferas, e estar de forma clara nos orçamentos públicos – e não custeado de forma indireta e pouco transparente por tarifas de energia.

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